2008-05-09

Aos que Vivem

Era quase um sempre: travestido de nunca. Todas aquelas palavras que nada ou muito significavam, toda aquela roupa molhada cheirando a chuva, era tudo muito rápido, inconstante, meio escuro talvez.

Todas aquelas pessoas correndo vagarosamente em volta da praça, parecendo desaparecer lentamente de todas as vistas, para algum dia ou hora ou mês ou segundo que o valha, retornarem ao princípio, munidas de um falso desejo de liberdade vã.

Era quase cinza, quase claro, quase todas as tardes. Aquelas flores mordidas pelos cães famintos, aquela música que parecia sair de todas as bocas, as notas musicais que se partiam, o êxtase, a [falta de] respiração, o alento.

Todos os chãos ali estavam, daqui se podia ver, sentir, esmerar a lembrança que se achava estar escondida em cada canto de todos aqueles quartos imundos, repletos de lençóis levemente molhados, impregnados por cada gota de saudade que ali se fazia existir.

Mas não era mais vã a vontade que se tinha de ali estar, nem eram mais frágeis os corpos que se debatiam de forma perene, nem era mais sujo o piso que jazia encharcado. Existia então um sentido que não haveria mais de ser descoberto ou imposto, por trás de todas aqueles remendos e toda aparente parafernália, por debaixo de todos aqueles pés que se entrelaçavam mudos.

À espreita de todo dolorido e imanente vazio, era possível existir o horizonte que finalmente se quedava, quase infantil, vagarosamente, eternizando a paisagem e transbordando em risos todo o leve desespero que até então habitava aquelas almas fastigadas.

Era quase um fim: travestido de esperança.

5 comentários:

Felipe Brito disse...

Belo texto, cheio de vocábulos precisos!

Mas...ficaram por aqui algumas incógnitas.

Outra coisa, aprecio essas observações dos lugares públicos em contraposição aos cantos domésticos nossos de cada dia. Praça/quarto, mesa de bar/cama, colégio/sala...

*Ah, voltemos a blogar, todos nós!

Abraços!

*Cabanãs mandou um abraço também...hehe

Tainá disse...

[o que será que será
que andam suspirando
pelas alcovas?]

comentário primário talvez, mas o que me chamou atenção mesmo foram os pés que se entrelaçavam mudos.

Anônimo disse...

eu que passo por aqui dariamente à espera de um texto seu fiquei simplesmente exultante com esse...
obrigada... please, poste mais vezessss
bjos

Anônimo disse...

difícil é saber que coisas existem sem a presença de um disfarce... sempres e nuncas são tão interdependentes.

lindo o blog.

Eduardo Winck Veiga disse...

Teus textos não se cansam em me agradar...

"Existia então um sentido que não haveria mais de ser descoberto ou imposto, por trás de todas aqueles remendos e toda aparente parafernália, por debaixo de todos aqueles pés que se entrelaçavam mudos."

Muito bom, abraço.


Ps: No comentário anterior eu deixei meu msn para você, você me adicionou, e eu não lembrando fui falar contigo neste e pedi se tinha me adicionado, e tu disse que não e acho que bloquiou/excluiu, ficou offline do nada para todo o sempre.